E então olhei para aquela face.
Já não reconhecia mais seu sorriso, sua risada alta e nem mesmo sua voz estrondosa. Na minha frente, apenas vi. Senti uma dor pulsar dentro de mim, e meu coração parecia querer lutar contra meu cérebro, tentando ter mais razão que ele próprio.
E então olhei para aqueles olhos.
Já não reconhecia mais a vivacidade de suas pupilas, que antes eram blindadas por óculos. Quando nossos olhares encontraram – se, a dor parecia insuportável. As lágrimas estavam prontas para sair a qualquer momento, bloqueadas apenas pela minha própria razão. Na minha frente, consegui ver apenas uma criança, marcada pelo tempo cruel e sádico. Seu rosto tinha uma expressão vazia, mas que claramente demonstrava tristeza. Dor. O tempo parecia estar regredindo, e seus lábios, que movimentavam – se repetidamente a fim de tentar, inutilmente, triturar os mínimos pedaços de alimentos, gritavam , silenciosamente, por socorro.
E então olhei para aquele tronco.
O forte corpo, que antes levava – me para lugares distantes, agora parecia uma simples estrutura frágil. As mãos, que antes me seguravam com toda a força, protegendo – me de todo e qualquer perigo, agora eram simples marcas do passado, que lentamente mexiam – se, a fim de mostrar que ainda estavam ali. A cadeira, que antes era um grande símbolo de seu espaço, agora parecia a única coisa que o sustentava e fazia-o permanecer em tal estado.
Um segundo havia se passado, mas era como se, ao presenciar tal cena, estivesse vendo um filme de toda uma vida. Lembranças, vozes e momentos bombardearam minha mente, e deram mais força às lágrimas, que incrivelmente ainda estavam relutantes em sair.
Um segundo. Não foi o suficiente para que eu, fraco, pudesse dizer algo, no mínimo, estimulador. Simplesmente soltei um “Oi, vô”, minha voz mais parecendo um sussurro rápido e seco. Olhei inutilmente para seu rosto, na esperança de que aquelas meras duas palavras tinham chegado até ele. Seus olhos apenas se voltaram para mim, enquanto eu lentamente saia de seu campo de visão. Sua expressão permaneceu a mesma, sem se quer uma mudança. Minha presença, naquele mísero minuto, não havia sido de nenhuma ajuda. Saí carregando em meu ombro uma culpa inexplicável, ao mesmo tempo em que me envergonhava de tamanha estupidez.
Seus gritos ao longo da noite passada pareciam afiadas facas, que apunhalavam a todos a sua volta. Sua dor parecia materializar-se junto com as vibrações, atingindo, dramaticamente, meu coração. Sentia-me fraco, inútil, inexistente. Nada do que tentava parecia diminuir seu sofrimento. O meu sofrimento.
Apenas fechei os olhos e, finalmente, deixei que as lágrimas caíssem furiosamente, tentando, de alguma forma, aliviar a minha dor. A dor de perde-lo.
"You'll always be in my heart. Love U, Grandpa.